Esqueça o jornalismo investigativo, “new jornalism” e quetais. A forma de se fazer notícia no Brasil é peculiar e se divide em várias categorias, todas pitorescas. Conheça algumas delas:
Jornalismo Manoel Carlos
Já perceberam como jornal adora uma novela? Todos ficam esticando por semanas – às vezes por meses – um assunto que deveria ganhar repercussão por, no máximo, cinco dias. Ninguém aguenta mais, mas todos os veículos prolongam os temas com pautas sensacionais do tipo. “Garota assassinada era fã de Britney Spears”, “Deputado acusado de corrupção trabalhou como garçom na juventude” ou “Na várzea, Ronaldo fez muitos gols como o da semana passada”. Os editores só esqueceram de uma coisa: novela era longa nos anos 60, quando não existia nada para se fazer à noite.
Over mídia
Sou de um tempo em que “drama” era ficar sem os movimentos da perna em razão de um acidente e “tragédia” era perder toda a família numa chacina ou deslizamento de terra. Mas algo mudou de uns anos para cá: ou estes termos foram banalizados pela mídia ou os valores mudaram a ponto de os problemas acima se tornarem pequenos. Afinal, “drama” mesmo quem passou foi Bruno Senna, que corre o risco de não correr a Fórmula 1 este ano. Que o digam os incontáveis jornais e revistas que usaram a expressão para falar sobre o caso.
Jornalismo Você S/A
Esta não é uma crítica à publicação. Afinal de contas, por mais chata que seja, a revista é segmentada e apenas cumpre seu papel de atender bem seu público alvo (não, meu filho, não foi uma insinuação. Eu realmente quis dizer que esse povo é chato). Assim como uma revista sobre celebridades usa expressões como “fashion”, “poderosa”, “adoro” e afins, a Você S/A vai nos entupir de palavras modernosas como “networking”. Foda é você ver aspones bancando o executivo e anunciando que precisam de profissionais para um “job”. Daí assessor de imprensa vira “analista de comunicação” e o faxineiro vira “gestor de limpeza”. Agora imaginem as matérias produzidas num ambiente assim…
Escolinha Matinas Suzuki
O jornalista supracitado é conhecido por ser um dos artífices da “Revolução dos Menudos”, como ficou conhecido o processo de reformulação da Folha de S. Paulo nos anos 80. Sempre me chamou a atenção a postura do japa nas fotos: de terno e gravata, impecável e sempre de braços cruzados, mais parecendo um executivo que um jornalista. Desde então, editores e donos de jornais pagam de CEOs da casa do caralho, com a mesma pose. É da escolinha Matinas Suzuki que também sai a turma do Você S/A, descrita aí acima, que tenta encaixar expressões como “brainstorm” em um texto sobre acidente de trânsito ou o novo disco da Beyoncé.
Ejaculação precoce
Belo dia, uma grossa nuvem de fumaça sobe aos céus de São Paulo. Jornalistas, em todo o canto, começam a correr atrás de informações para soltar a matéria. Logo, chega à internet a primeira notícia sobre o assunto. Descobriram a causa da fumaça: queda de avião. Palmas para o autor, assinou um furo nacional. O jornalista mostrou rapidez, requisito fundamental para os corridos e dinâmicos dias de hoje. Será? Nem tanto. Poucos minutos depois, chega à tona a verdadeira notícia: o que de fato ocorrera foi um incêndio numa fábrica de colchões. Percebem a diferença entre uma coisa e outra? Dá pra acreditar que o primeiro jornalista REALMENTE apurou a notícia? Se isso é jornalismo, eu sou uma morsa.
Pré-fabricado
Nestes tempos internéticos, virou moda falar em “control C + control V” para falar sobre a triste mania de apenas copiar as matérias alheias. É o tal do “Jornalismo Google”, outra expressão muito usada. No meu tempo de faculdade, quando a internet engatinhava e ainda havia máquinas de escrever no campus, a expressão era “Gilette Press”. Mas pior que copiar matérias é quando conceitos são copiados. Sabe aquela frase que alguém fala e é imediatamente copiada à exaustão, sem que ninguém pare para pensar no que significa aquela frase? Leia qualquer página em qualquer jornal e você lerá toneladas de exemplos.